Crescimento no número de preprints é impulsionado por pandemia
por Tayná Fiúza

Tempo de disponibilização reduzido, economia de recursos financeiros, garantia sobre a originalidade da descoberta e acesso amplo à comunidade são algumas das vantagens da submissão de manuscritos na forma de preprints.

A publicação de resultados preliminares é uma prática encorajada e executada há anos em diferentes áreas do conhecimento como a matemática e a física. Os preprints, como são chamados estudos publicados cuja metodologia e resultados não foram formalmente avaliados por pares, têm sido fortes aliados na divulgação de informações durante a pandemia da Sars-Cov-2. Estes estudos são disponibilizados em repositórios abertos e gratuitos como o arXiv (mais voltado para as áreas de física e ciência da computação), bioRxiv (ciências biológicas), ChemRXiv (química), medRxiv (ciências médicas).

Gráfico disponível em https://rxivist.org/stats com o número de submissões mês a mês no servidor bioRXiv desde sua criação.

Enquanto existe uma celeridade na disponibilização dos dados que define a originalidade do estudo, atribuindo novas metodologias, análises e resultados aos autores, a ausência do processo de revisão pode contribuir com a prática da salami science e mesmo com a propagação de erros metodológicos. Há ainda uma preocupação quanto ao roubo de ideias executadas em estudos de pequena escala e sua subsequente aplicação em um estudo similar de maior escopo, publicado em uma mídia de alto impacto.

De qualquer modo, a popularidade deste modo de publicação vem crescendo e outra vantagem citada é a economia, tanto no processo de publicação quanto no acesso a outros estudos. Este é um fator de bastante impacto especialmente em países e centros cujos recursos para o desenvolvimento da pesquisa são limitados e vem sendo reduzidos - e num cenário pós-pandêmico imediato é esperado que as prioridades econômicas de algumas nações não se alinhem àquelas do desenvolvimento científico.

Gráfico disponível em https://rxivist.org/stats com o número de submissões mês a mês, separados por campo de estudo. Em verde, o número de submissões mensais relacionados à bioinformática.

Ainda dentro do aspecto econômico, o registro de uma pesquisa em andamento através de sua publicação seria uma forma de evitar a duplicação de estudos e estimular um redirecionamento de metodologias, mudança de ferramentas ou estabelecimento de parcerias por parte do(s) grupo(s) que estão investigando questões semelhantes.

As publicações preliminares abrem espaço para uma troca muito rica entre a comunidade e os autores, que por sua vez, podem acatar as sugestões e perceber limitações e falhas a serem consideradas em versões posteriores do trabalho - publicadas em repositórios sem revisão de pares ou não. Contudo, para que esta dinâmica funcione o uso destes repositórios pela comunidade deve ser encorajado, uma vez que ainda há uma baixa interatividade entre pares nos espaços disponíveis para cada publicação.

Outro benefício inerente a esta modalidade é a possibilidade de publicar resultados negativos, os quais na maioria dos casos não são aceitos em periódicos com revisão por pares. Diversas áreas e grupos poderiam focar seus esforços em caminhos de fato não explorados, uma vez que teriam um conjunto robusto de trabalhos que apontam metodologias e abordagens mal sucedidas.

Ainda nesse período, alguns pesquisadores têm se organizado para fazer uma revisão ou curadoria dos preprints disponibilizados - fazendo suas considerações nos comentários de dezenas de estudos publicados, contribuindo assim com o processo de seleção e auto-correção dos trabalhos. Essas e outras iniciativas surgidas para acelerar o acesso ao conhecimento científico antes e durante a pandemia prometem mudanças estruturais significativas na dinâmica de compartilhamento, revisão e acesso a estudos produzidos globalmente.

Glossário:

“Salami Science” é a prática de fatiar uma única descoberta, como um salame, para publicá-la no maior número possível de artigos científicos. (Herton Escobar, Folha de São Paulo).

Referências:

Souza J. R. S. A emergência dos preprints para a ciência brasileira: considerações sob a ótica da Enfermagem. Rev. esc. enferm. USP 2019 Dez 13.

Callaway E. Will the pandemic permanently alter scientific publishing?. Nature. 2020 Jun 3.