Quando teremos os genomas da nossa biodiversidade?
por Tetsu Sakamoto

As ações e os movimentos ocorridos pelo mundo afora em prol da Amazônia demonstram a preocupação mundial com a preservação da sua biodiversidade. E de fato a preocupação é válida, já que relatórios indicam que nos últimos 42 anos a população dos vertebrados diminuiu 58% e que existem pelo menos 28.000 espécies que se aproximam da extinção1,2. Em resposta a esses dados alarmantes, ações de preservação da biodiversidade têm se intensificado, e o interessante é que uma destas ações está diretamente relacionada a nós, Bioinformatas (ou aspirantes a), que é o sequenciamento do genoma. A importância de se sequenciar os genomas no contexto da preservação se baseia no argumento de que muitas soluções para os problemas da humanidade podem estar presentes nestes organismos que nunca tiveram as suas informações genéticas acessadas. Tais organismos e seus genomas podem fornecer a matéria bruta para abordagens de engenharia genômica e biologia sintética para produzir de forma sustentável produtos inspirados em materiais biológicos3.

Exemplo de animal da nossa biodiversidade

Sequenciar genomas de grandes quantidades de espécies é uma tarefa árdua, mas vários países e consórcios internacionais lançaram recentemente projetos que procuram sequenciar o genoma de todas as espécies da sua biodiversidade ou de um grupo taxonômico. Temos como exemplo o Darwin Tree of Life Project4, que procura sequenciar o genoma de todas as 60.000 espécies conhecidas do Reino Unido, e o Vertebrate Genome Project5, um consórcio internacional que quer sequenciar todas as 66.000 espécies conhecidas de vertebrados. Taiwan, que é um país que abriga uma biodiversidade considerável (1,5% da biodiversidade mundial), lançou o Taiwan Biogenome Project, que objetiva sequenciar genomas de 1.000 espécies endêmicas do país. Já os nossos vizinhos chilenos lançaram o Chilean 1000 Genomes Project, que quer sequenciar 1.000 genomas da população chilena mais 1.000 genomas de espécies chilenas não humanas.

Apesar do Brasil ter um papel fundamental nesta questão da preservação da biodiversidade, já que o país abriga mais de 10% da biodiversidade mundial, quando se trata de pesquisas relacionadas ao sequenciamento do genoma das espécies nativas do país ainda somos tímidos. Considerando apenas o Filo Chordata (que abrange os vertebrados, tunicados e anfioxos), das 2.261 espécies nativas e endêmicas registradas no Catálogo Taxonômico da Fauna Brasileira6, apenas duas espécies possuem o seu genoma sequenciado.

Os números são decepcionantes, mas a boa notícia é que existem iniciativas que procuram mudar este quadro. Em novembro de 2018, o Brasil passou a fazer parte do Earth Biogenome Project3,7,8, um consórcio internacional lançado no mesmo ano com o objetivo de sequenciar mais de 1,5 milhão de espécies de eucariotos catalogados nos próximos 10 anos.

O Brasil ainda não possui um projeto próprio de sequenciamento de genoma com essa magnitude, mas a tendência mundial indica que as iniciativas desta natureza são necessárias. Brevemente tais projetos serão lançados e Bioinformatas brasileiros também poderão colaborar com a preservação da biodiversidade do planeta. Esta nova onda de dados biológicos já se encontra no horizonte e atingirá principalmente os atuantes na área de evolução e de genômica comparativa. Até que a onda não nos atinja, o que nos resta é preparar para receber esses dados. Afinal de contas, não queremos (e não podemos) ficar para trás nas novas descobertas que esta avalanche de dados pode oferecer.
Nossa infraestrutura atual é suficiente para receber esses dados?
Existem pessoas treinadas para analisar esses dados?
As ferramentas e/ou algoritmos usados são adequados para lidar com esses dados?
(E o mais importante) Quais novas perguntas poderemos responder com estes novos dados?
Há muito o que pensar em nossa próxima caminhada ou ida para o trabalho...

Referências:
1 World Wildlife Fund (2016) Living Planet Report 2016: Risk and resilience in a new era (World Wildlife Fund, Gland, Switzerland);2 IUCN Red List of Threatened Species (consultado em 13/10/2019) ( [https://www.iucn.org/resources/conservation-tools/iucn-red-list-threatened-species)](https://www.iucn.org/resources/conservation-tools/iucn-red-list-threatened-species)3 Lewin, H.A. et al. Earth BioGenome Project: Sequencing life for the future of life. Proceedings of the National Academy of Sciences Apr 2018, 115 (17) 4325-4333; DOI: 10.1073/pnas.1720115115;4 Darwin Tree of Life Project ( [https://www.sanger.ac.uk/news/view/genetic-code-66000-uk-species-be-sequenced](https://www.sanger.ac.uk/news/view/genetic-code-66000-uk-species-be-sequenced))5 Vertebrate Genome Project ( [https://vertebrategenomesproject.org/](https://vertebrategenomesproject.org/))6 Catálogo Taxonômico da Fauna Brasileira (consultado em 13/10/2019) ( [http://fauna.jbrj.gov.br/](http://fauna.jbrj.gov.br/) )7 Earth Biogenome Project ( [https://www.earthbiogenome.org/](https://www.earthbiogenome.org/) )8 Memorando de entendimento ( [http://www.fapesp.br/13012](http://www.fapesp.br/13012) )