Andrea Kaufmann Zeh
por Tainá Fiuza

Andrea Kauffmann Zeh é Bióloga formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Doutora em Biologia Molecular pelo Ludwig Institute for Cancer Research. Foi editora Sênior do periódico Nature de 1997-2003 em Londres. Atualmente, possui uma empresa de consultoria científica, a PaperLab, por meio da qual ministra workshops e palestras para auxiliar a comunidade acadêmica na escrita científica.

- Costumamos pensar na submissão de um artigo pela visão do pesquisador, e em todas as preocupações que envolvem o processo inteiro. Gostaríamos de saber um pouco de você como pesquisadora que já trabalhou do outro lado, como editora sênior da Nature, sobre os desafios que você enfrentou nesse cargo, e quais eram os principais problemas que você costumava encontrar em uma revisão de artigo?

O nível das publicações que são submetidas para Nature já é bastante alto. Então, tentar fazer uma seleção que fosse correta diante de tantos bons papers era um dos principais desafios. E na realidade não é porque o artigo não é publicado na Nature que não é ciência ou que não é um bom paper. Eu sempre falo que a ciência é feita sim de Nature e Science, mas também é feita por todas as outras publicações, seja em jornais com menor ou maior impacto. Ou seja, cada artigo tem sua função, todos eles são importantes. Entretanto, aqueles que lá chegavam exigia que tivéssemos um cuidado muito grande para dar espaço àqueles que realmente tinham uma mensagem diferenciada e impactante sem injustiçar os demais.

- Nos últimos anos, tivemos um aumento no número de publicações no país, em contrapartida o nível de impacto desses trabalhos não acompanhou esse crescimento e ainda nos encontramos, em algumas áreas, abaixo da média mundial. Como você acha que deve ser avaliada a produção científica de um país ou de uma universidade? Você acha que realmente o número de citações por paper reflete a contribuição de um trabalho para a ciência?

Particularmente eu acho que está todo mundo repensando os métodos de avaliar se determinado trabalho é ou não relevante para a ciência. Na minha opinião, apenas citações por paper não é suficiente, mas é a métrica que hoje vigora. Acredito que, como comunidade científica e sociedade, precisamos discutir e chegar em um consenso. Eu diria que o número de citações por paper é uma medida que pode sim entrar no processo de avaliação, mas que não seja o único aspecto a ser avaliado. Entretanto, a gente precisa ser realista. Necessitamos trabalhar para ter um tipo de avaliação mais justa e que seja mais realista para os cientistas, sociedade, agências financiadoras, órgãos de pesquisa e ensino. Mas até ocorrer a mudança desse paradigma, temos que tentar sempre buscar caminhar na nossa pesquisa com os recursos e métodos de avaliação que temos atualmente.

- Entre as causas mais citadas para esse baixo impacto das publicações estão questões como mudanças que estão sendo realizadas no país, a ausência de fomento mais recente, a burocratização que existe dentro da academia, o pesquisador ser professor e também ter outras atribuições, o conhecimento limitado da língua inglesa, entre outras. Na sua opinião, qual é a causa raiz?

Todas as questões mencionadas são muito pertinentes, mas uma das principais é a formação estratégica do cientista. Acho que precisamos trabalhar a formação do cientista de forma a fazer ele pensar estrategicamente. Muitas vezes o processo de formação do profissional é uma mera repetição do que já estava acontecendo, do que era comum ao ambiente em que aquele profissional estava inserido. Acredito que precisamos formar cientistas e não técnicos. Não desmerecendo o trabalho dos técnicos pois são altamente necessários para que muitos estudos sejam concluídos. Mas, a ciência precisa de pessoas que realmente pensem fora da caixa, esse é um desafio que temos a resolver, embora já tenhamos muitos profissionais que são cientistas e fazem ciência de fato.

- Você, atualmente, trabalha dando consultoria para a escrita e publicação de artigos. Baseando-se nos trabalhos que você recebe para revisar, quais são as principais falhas que você encontra?

O tipo de assessoria que eu presto é mais estratégica. Eu analiso desde o projeto de pesquisa até papers prontos para a publicação. Ou seja, o meu trabalho vai desde antes de se construir o projeto propriamente dito e mandar para uma fonte de financiamento, até o momento da submissão. Por isso existem estratégias distintas para as avaliações. Quando eu estou trabalhando no momento em que o cliente está pensando o projeto, a gente tem como repensar algumas questões que podem dar problemas na frente. É óbvio que na ciência nem sempre dá para ter controle de todos os fenômenos, mas esse planejamento inicial faz toda a diferença. Agora, se eu estiver trabalhando na revisão de um paper já pronto acabo fazendo um trabalho de troubleshoot. Nesse caso é tentar fazer daquele paper o melhor que ele pode ser. Talvez mudando a forma da escrita sem mudar dado nenhum, pois dado é dado, mas a forma de ver e de apresentar esses dados fazem toda a diferença. A grande questão é fazer deste paper o melhor que ele pode ser e buscar a melhor revista possível para ele.

- Além da consultoria para construção e revisão de papers, que outros serviços sua empresa presta?

Fazemos workshop para 60 pessoas, onde eu apresento as técnicas para construção de artigos do zero ou melhoria daqueles que os grupos de pesquisa já possuem em andamento. Oferecemos uma modalidade para estudantes, onde é solicitado a confecção de um artigo fictício no workshop de 16 horas. Também oferecemos um curso de 40 horas, onde o primeiro passo é ver os resultados e ao final da semana estamos com o paper pronto. Para isso os dados precisam já estar coletados e analisados. Nós organizamos esses eventos em qualquer universidade desde que o tema esteja englobado nas ciências da vida.